A juíza Rosana Navega Chagas, do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, afirmou que caso tenham sido apresentados laudos que afirmam que os bois embarcados no navio NADA, no Porto de Santos, estavam em boas condições, os documentos não condizem com a verdade e, portanto, incorrem em crime. Segundo ela, “é impossível que algum laudo possa atestar que o animais estão bem, pois contra fatos não há argumentos”.

No parecer, a juíza expõe o artigo 69 A da Lei 9.605/98, no qual podem ser enquadrados os responsáveis por laudos falsos. De acordo com a legislação, “elaborar ou apresentar, no licenciamento ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão: pena de reclusão, de 3 a 6 anos, e multa”. Ainda segundo a lei, “a pena é aumentada de 1/3 a 2/3, se há dolo significativo ao meio ambiente, em decorrência do uso da informação falsa, incompleta ou enganosa”.
De acordo com a magistrada, os animais já começaram a ser vítimas de sofrimentos intensos desde as fazendas de origem, devido à longa e estressante viagem a que foram submetidos até o Porto de Santos. “Para adentrarem forçadamente no navio, levam choques elétricos, procedimento que, infelizmente, é permitido no Brasil, mas, em um contexto de fatos, também já contribuiu para o grande estresse e sofrimento dos animais”, afirmou a juíza ao abordar a forma como é realizado o embarque dos bois.
O parecer explica também que a viagem feita pelo navio, por ser longa e extremamente cansativa, também configura maus-tratos. Durante o trajeto, os bois são obrigados a ficar em pé por semanas, pois se forem mantidos deitados podem ser pisoteados.
“Vários laudos apresentados por ONGs, etc, deram conta e comprovação plena de que os animais embarcados no navio Nada estavam em lastimável estado, mergulhados nas suas fezes e urinas, desesperados e em franca e chocante situação permanente de maus-tratos evidentes incontestes”, declarou Rosana.
Com base nas comprovações de maus-tratos apresentadas, a juíza conclui que “caso tenha sido apresentado ou elaborado, algum estudo ou laudo, atestando que os bois embarcados no navio Nada se encontravam em bom estado, este laudo ou estudo será completamente falso, sujeitando os seus autores nas penas do Artigo 69 da Lei 9.605/98: 3 até 6 anos de cadeia, aumentada de 1 até 2/3, diante da dimensão do dano”.
A magistrada afirma ainda que não são apenas os autores dos laudos falsos que incorrem em crime. “Todas pessoas, sejam elas políticos, dirigentes, empresários, governadores, deputados ruralistas, ministros de Estado, etc, e que também tenham utilizado estes laudos para justificar a recente exportação, todas estas pessoas terão efetivamente concorrido para os crimes ambientais positivados no navio Nada, no que também serão enquadrados no mesmo crime”, explicou. “Assim ocorre, por força do Artigo 69 A da Lei 9.605/98, cujas penas criminais também têm aplicação, por decorrência do artigo 2º desta lei, ao estabelecer que ‘quem, de qualquer forma, concorre para a prática dos crimes previstos nesta lei, incide nas penas a este cominadas'”, completou.

Rosana comenta também que os “delitos comentados são crimes ambientais, e estão previstos na Lei da Ficha Limpa”, cuja condenação acarreta “a inelegibilidade das pessoas que o cometeram, por 8 anos”.
Para que o processo contra os responsáveis por laudos falsos e por usá-los para defender a exportação de animais vivos seja iniciado, explica a juíza, é preciso que haja apresentação da representação das ONGs e demais interessados, para que seja realizada a denúncia, “devendo as representações contra todos os envolvidos serem encaminhadas à Procuradora Geral da República, Raquel Dodge, solicitando as providências cabíveis”.
A magistrada lembra ainda um questionamento feito pelo jornalista André Trigueiro que, ao participar do programa “Estúdio i”, classificou como “algo bizarro” a declaração feita pelos responsáveis pela embarcação de que o navio realiza uma pequena inclinação, após funcionários jogarem água nas baias onde são mantidos os bois, para limpar a imensa quantidade de excrementos do local. “Se inclinarem o navio para escoar a urina e as fezes dos bois, os animais também irão se inclinar e o imenso peso fará com que o navio afunde”, declarou a juíza que alega ser impossível inclinar a embarcação, devido aos riscos, e cita, inclusive, o caso do Bateau Mouche como exemplo de navio que naufragou após a tripulação se inclinar para ver os fogos na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro.