
Um novo tempo no ensino que já é realidade nas maiores universidades do mundo chega aos poucos ao Brasil. Trata-se da adoção de métodos substitutivos ao uso de cobaias, garantindo aos estudantes um aprendizado que, além de ético, é também comprovadamente mais eficiente já que permite que cada aluno treine muito mais vezes cada procedimento.
Para se ter uma ideia desse avanço na área da Educação, basta citar que 100% das universidades médicas dos EUA e Canadá não usam mais cobaias no ensino e as de Medicina Veterinária, além de fazer uso de bonecos realísticos e simuladores, têm implantado programas de aprendizado que beneficiam animais de populações carentes seja no campo ou nas regiões rurais.
Em junho, o Projeto de Lei 706/2012 do deputado estadual Feliciano Filho (PSC), que propunha a eliminação do uso de cobaias no ensino, foi aprovado na Assembleia Legislativa de SP (Alesp), mas vetado pelo governador Geraldo Alckmin. No momento o deputado trabalho a derrubada do veto dentro da Alesp.
Enquanto isso, algumas universidades de SP já estão funcionando conforme as tendências mundiais de ensino. Nessa entrevista a professora Paula Bastos, coordenadora do Mestrado em Bem-Estar Animal do Complexo Educacional FMU – Faculdades Metropolitanas Unidas, conta como a instituição administra seu curso de Veterinária sem uso de cobaias:

ANDA – Desde quando a FMU utiliza métodos alternativos no curso de Veterinária?
Paula Bastos – Com o início dos trabalhos da Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) em janeiro de 2013 e a avaliação de protocolos de aulas práticas, percebemos que não fazia mais sentido manter animais como modelos para essas aulas. Uma das preocupações da CEUA foi verificar a possibilidade de substituição do modelo animal. Os alunos de Medicina Veterinária do Complexo Educacional FMU têm contato com animais apenas por meio do atendimento aos animais que realmente precisam ser tratados. Então, podemos considerar que 2013 foi o ano que abolimos o uso prejudicial de animais em aulas.
ANDA – Quais são os métodos de ensino empregados pela FMU?
PB – Há o uso de cadáveres resfriados para treinamento de manobras como incisão, hemostasia, ligadura de vasos, técnicas de anaplastia e treino de técnicas cirúrgicas. Outra prática é o uso de corpos resfriados para treino de manejo de feridas abertas e realização de pensos e bandagens que também é feito com bonecos.
ANDA – Aulas de dissecação utilizam qual método alternativo?
PB – As aulas de dissecação são realizadas em cadáveres eticamente obtidos, ou seja, cadáveres de animais que chegam a óbito e o proprietário autoriza (por escrito) o uso dele em aulas práticas ou pesquisa.
ANDA – Como é feito o treino de aplicação de anestesia?
PB – Para o acesso venoso, o aluno é treinado em modelo artificial que simula braço e vasos de cão, por exemplo. Depois do treinamento ele participará de aula prática, no Hospital Veterinário, que será o atendimento do animal em situação real. Este tipo de aula é realizado sempre com a supervisão do professor.
ANDA – A partir de qual semestre os alunos entram em contato com os métodos alternativos e qual semestre passam a aprender com pacientes reais no hospital veterinário?
PB – A introdução das metodologias alternativas acontece desde o início do curso nas disciplinas de práticas veterinárias. Os alunos têm contato com a rotina clínica já no 1º semestre, onde acompanham os atendimentos na rotina do HOVET (Hospital Veterinário do Complexo Educacional FMU). No 8º semestre, estes estudantes acompanham os procedimentos cirúrgicos realizados nos pacientes durante as aulas práticas, onde têm a oportunidade de auxiliar em alguns procedimentos cirúrgicos.
ANDA – Porque a FMU optou por métodos mais modernos e éticos, sem uso de cobaias?
PB – Com a Lei 11.794 (Lei Aoruca) e a regulamentação do modelo animal, vigente até então, entendemos que, como a lei explicita, se há método alternativo/substitutivo ao animal, ele deve ser usado. Assim, passamos a instituir novas práticas sem o uso prejudicial do animal. Para a FMU esta mudança foi muito positiva, pois, além da habilidade técnica tão almejada pelo profissional, passamos a apresentar ao estudante a preocupação bioética que deve compor as competências de um médico veterinário.
* Fátima ChuEcco é jornalista ambientalista e atuante na causa animal