Por Leticia Filpi – Redação ANDA

O desembargador do Tribunal de Justiça de Goias, Kisleu Dias Maciel Filho, ao analisar recurso de apelação interposto pela defesa de Camila Correia, a enfermeira que, em novembro de 2011, matou a pancadas um filhote de yorkshire, reformou a sentença proferida em Ação Civil Pública,que condenou a agressora ao pagamento de R$ 20.000,00 a titulo de indenização por danos morais coletivos. O magistrado reduziu o montante indenizatório a irrisórios R$ 5.000,00.
Como justificativa, mencionou a carência financeira de Camila e afirma que sua decisão atendeu aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Pois, bem vejamos. Como pode ser razoável uma indenização de cinco mil reais diante de um crime que chocou a sociedade? As redes sociais ficaram lotadas de mensagens de repudio e indignação, vindas do Brasil inteiro. O crime foi cometido diante de uma criança de dois anos de idade. A ré ceifou a vida de um filhote indefeso através de chutes, pancadas e torturas. Ela arremessou o filhote ao chão, colocou um balde sobre ele para aterrorizá-lo. Gritou e xingou descontroladamente. Bateu nele, bateu muito, até levá-lo a óbito. Tudo isso devidamente filmado por testemunhas e diante da filha, um bebê tão inocente quanto a vítima.

O filhote teve uma morte lenta e dolorosa, sendo que sociedade teve acesso ao fato através dos videos divulgados na internet. Esse tipo de acontecimento gera um desconforto generalizado, uma dor coletiva. Foi com referência nessa dor que a lei criou a figura do dano moral coletivo.
Infelizmente, nosso ordenamento juridico não estabelece uma regra clara para o arbitramento da indenização quando se trata de danos morais, sejam eles individuais ou coletivos. A lei apenas manda que se adotem determinados critérios, sendo que o objetivo é compensar o dano, punir o responsável e educar, para que sejam evitadas novas condutas de mesmo teor.
Segundo a melhor doutrina, a decisão num caso em que há uma certa liberdade do juiz, deve levar em conta o triduo fato-valor-norma,ou seja, valorar o fato para aplicar a norma. Desse modo, o desembargador, ao aplicar a multa levando em conta mais as condições econômicas da ré do que a gravidade do fato, acabou por privilegiar os interesses do criminoso em detrimento da sociedade. Nas próprias palavras do ilustre magistrado, “reputo como excessivo o montante fixado pela douta julgadora de primeiro grau, destoando-se dos padrões da razoabilidade, vez que embora a intensidade do sofrimento psicológico causado pelo abalo coletivo sofrido, não pode e nem devem ser desprezadas, as condições pessoais e econômicas da requerida (…)”.
Ora, diminuir uma indenização de vinte mil para cinco mil reais é levar em conta APENAS as condições econômicas da requerida. No entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a indenização tem, além de outros, caráter exemplar. Nas palavras do Ministro Luis Fux: “A jurisprudência desta Corte Superior tem-se posicionado no sentido de que esse quantum deve ser arbitrado pelo juiz de maneira que a composição do dano seja proporcional à ofensa, calcada nos critérios da exemplaridade e da solidariedade”, – STJ, 1ª T., REsp 901.897, Rel. Min. Luiz Fux, j. em 25/11/2008.
Assim, andou mal o desembargador em sua decisão, afinal, a descrição dos fatos não deixa dúvida quanto à gravidade da conduta da enfermeira Camila. A extensão dano é gravíssima, posto que irreversível – resultou na morte da cachorrinha. Não obstante a jurisprudência consolidada, o Código Civil adota posição no mesmo sentido em seu artigo 944:
“A indenização mede-se pela extensão do dano.” Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.
Isso significa que o juiz poderá reduzir se houver excessiva desproporção entre a culpa e o dano. No caso, não houve, pois a autora dos fatos agiu com dolo de matar e de torturar. Ela quis esse resultado, portanto, não houve desproporção na fixação do valor de R$ 20.000,00. Sim, é necessário que se leve em conta as condições financeiras do agressor, entretanto, a ré tem profissão, bem como seu cônjuge. Não se tratam de pessoas miseráveis. Os cinco mil reais, com certeza, serão logo esquecidos pela família, que continuará a ter vida normal depois da quitação desta dívida. Já a sociedade jamais esquecerá do fato hediondo que Camila cometeu.
Desta forma, conforme toda a exposição acima, fica realmente difícil entender os motivos que levaram o magistrado a adotar posição tão favorável à agressora. Apesar de possuir certa liberdade para decidir, a orientação jurisprudencial e a lei vão no sentido contrario aos critérios por ele adotados. Sua decisão nada mais fez do que mostrar aos agressores de animais que fica barato torturar e matar.
